Madrasta

AMOR PROIBIDO

Diante do que tem sido divulgado de forma "espetaculosa" pelos mais diversos veículos de comunicação, só falta uma lei dizendo: "É proibido amar".

Diante da leviana afirmativa de que o simples namoro ou um relacionamento fugaz podem gerar obrigações de ordem patrimonial, começou-se a decantar a necessidade de o par firmar contratos buscando assegurar a ausência de comprometimento recíproco e a incomunicabilidade do patrimônio presente e futuro.

Assim, parece que o amor está virando um negócio, onde ninguém mais pensa na alegria de ter alguém, pois vive com medo de que o "querer" bem se transforme em "dividir" bens...

Portanto, com o intuito de prevenir responsabilidades, acaba-se por monetarizar as relações afetivas. Esquece-se um fato: somente geram encargos os relacionamentos que, por sua duração, levam a um tal envolvimento de vidas, que provocam um verdadeiro embaralhamento de patrimônios. Esta é a única hipótese em que o Judiciário reconhece a necessidade de partilhar o que foi adquirido após o início da vida em comum. A obrigação alimentar, por outro lado, só é imposta, depois de um longo período de convivência, a favor de quem – geralmente a mulher – se dedicou exclusivamente aos cuidados com a casa e a prole, não tendo mais condições de ingressar no mercado de trabalho para prover a própria sobrevivência.

Como se tudo isso não bastasse, faz-se outra espécie de terrorismo. Não se consegue detectar a origem do que vem sendo alardeado, até por charges via internet: que existe no casamento o "débito conjugal", ou seja, um cônjuge deve ceder à vontade do outro, atendendo ao seu desejo sexual. Tal obrigação não está na lei. A previsão da "vida em comum" entre os deveres do casamento (atual Código Civil, art. 230, II e novo Código Civil, art. 1566, II) não significa imposição de "vida sexual ativa" ao par ou a obrigação de manter "relacionamento sexual" com o outro. Esta interpretação infringiria o princípio constitucional do respeito à dignidade da pessoa, além de violar a liberdade e o direito à privacidade, afrontando a inviolabilidade do próprio corpo. Não existe sequer a obrigação de se submeter a um beijo, afago ou carícia, quanto mais de se sujeitar a práticas sexuais pelo simples fato de estar casado. Mas talvez o mais absurdo seja sustentar que o descumprimento de tal "dever" dá ensejo à pretensão indenizatória por dano moral. Como se o respeitar a própria vontade afrontasse a imagem do outro ou sua conduta ética.

Não é só. Também se sustenta – igualmente sem qualquer respaldo legal – que o fim do amor gera o dever de indenizar, como se o casamento fosse um contrato indissolúvel e a busca da separação configurasse descumprimento de cláusula contratual, com a possibilidade de gerar direito à reparação por dano moral. Mais uma vez, é de questionar qual o bem jurídico violado que ensejaria o reconhecimento de um abalo à estrutura pessoal, capaz de configurar responsabilidade civil.

Preciso é que as pessoas acreditem na sabedoria da Justiça em distinguir as situações, mesmo quando, em face da evolução dos costumes e do desenvolvimento da sociedade, os relacionamentos se tornem íntimos de forma quase instantânea. No entanto, não desapareceu a beleza do namoro que não enseja responsabilizações de qualquer ordem.

Está na hora de se buscar a felicidade, usufruindo-se exclusivamente das alegrias que o comprometimento afetivo enseja, isto é, o direito de ter alguém em quem confiar, com quem dividir tristezas e multiplicar bons momentos. Que a responsabilidade daí decorrente fique por conta da tão repetida frase de Sant Exupéry: És responsável por quem cativas. É só isso que o amor gera: o direito de ser feliz e o dever de fazer o outro feliz.

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GUARDA COMPARTILHADA - OPÇÃO MADURA ...

GUARDA COMPARTILHADA - OPÇÃO MADURA PARA UMA SAUDÁVEL CONVIVÊNCIA ENTRE FILHOS E PAIS SEPARADOS

A hora da separação de um casal é sempre um momento difícil, pior ainda quando pai e mãe se separam, disputando a guarda do filho. Desde a aprovação do divórcio no Brasil em 1977, a esmagadora maioria das separações manteve a guarda das crianças com as mães.

Mas nestes quase 30 anos, os homens passaram a reivindicar mais a convivência com os filhos, o que culminou com artigo no novo Código Civil, em 2003, que determina que pais e mães separados têm direitos iguais de ficar com a guarda dos filhos.

Pensando no bem-estar da prole, cresce o número de casais que fazem um acordo para que as crianças não fiquem nem com ele nem com ela, mas com os dois. É a chamada guarda compartilhada, em que o casal, depois da separação, divide as responsabilidades na guarda dos filhos, decide junto questões relacionadas à educação e ao ensino formal, respondem igualmente pela criança, acabam com os famigerados dias e horas marcados de visita e, em alguns casos, até alternam a convivência com a criança, que passa a viver nas duas casas em períodos mais ou menos iguais.

A guarda compartilhada, porém, ainda não é um instituto devidamente regulamentado. É um acordo dos pais, uma situação de fato, mas não de direito. Mas está a caminho de virar lei.

Um projeto de 2002 do então deputado Tilden Santiago não só regulamenta a guarda compartilhada, como põe a modalidade como primeira opção do juiz no momento de decidir de quem será a guarda.

"A tendência mundial é o reconhecimento da guarda compartilhada como a forma mais adequada e benéfica nas relações entre pais e filhos, servindo como tentativa para minorar os efeitos desastrosos da maioria das separações", afirma Santiago na justificativa do projeto.

Ele diz que encaminhou a proposta inspirado nos movimentos de pais e mães separados de todo o Brasil e movimentos de cidadania para o reconhecimento dos direitos e deveres de quem, mesmo após a separação, quer manter o relacionamento com os filhos, com suas responsabilidades e obrigações.

O projeto tramita na Câmara e, em 1º de dezembro do ano passado, recebeu parecer favorável da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Agora, aguarda a vez para ir à votação no plenário.

Para o advogado Luiz Kignel, especialista em Direito de Família, a guarda compartilhada é um avanço para a educação dos filhos, que pode contribuir para que a criança supere algumas inseguranças da separação, mas desde que os pais saibam manter o equilíbrio e não transformem a situação em um "cabo de guerra".

"Eles precisam se entender, conversar muito e manter uma certa unidade. Não dá para um ficar fazendo intrigas contra o outro, ou ficar oferecendo mais vantagens ou mais mimos para a criança só para dizer ‘olha, aqui na minha casa é mais legal’ ou ‘comigo você é mais feliz’", explica Kignel.

Para ele, uma das maiores desconfianças em relação à guarda compartilhada é que, geralmente, o cônjuge que não detém a guarda dos filhos é que propõe essa modalidade. "É muito importante analisar detalhadamente e perguntar para quem será melhor a adoção da guarda compartilhada: para os pais ou para as crianças? Se a resposta não for as crianças, melhor nem tentar", alerta Kignel.

Outro risco é a perda de disciplina da criança ou do adolescente. O pai ou mãe, para cativar mais o filho, acaba fazendo pequenas concessões diárias que vão alargando os limites da criança. É um sorvete a mais no passeio; é a televisão ligada até tarde, as verduras e legumes que podem ser deixados no prato; vistas grossas para faltas no colégio; passividade diante de grosserias, respostas desrespeitosas e conduta inadequada; retornos das baladas cada vez mais tarde, às vezes, bêbados...

Para a orientadora familiar Roberta Palermo, a questão não é manter os filhos sob castigo ou rígido regime disciplinar, mas afrouxar os limites não é bom para a criança: "respeitando as diferenças, pai e mãe precisam impor regras gerais iguais. Pelo bem dos filhos, senão eles ficam sem chão, e vão tornar-se pessoas inseguras".

Ela, que se formou em arquitetura, viveu situações pessoais peculiares com a separação. O que a levou a trabalhar com terapia familiar. Filha de pais separados e casada com um homem separado que já tinha dois filhos, Roberta lançou um livro sobre o assunto e criou a AME (Associação das Madrastas e Enteados). A AME organiza encontros e discussões para mulheres que se relacionam com homens que já têm filhos e lidam com a presença das ex-mulheres. A associação tem até um site (www.madrasta.hpg.com.br) que mantém um fórum permanente de discussões.

"Minha madrasta tinha um relacionamento muito ruim comigo. Quando me casei com um homem que tinha dois filhos pequenos, fiz de tudo para não repetir as péssimas referências que trazia", revela a terapeuta.

Roberta conta que a sugestão para a guarda compartilhada dos filhos do marido partiu dela. Na época, eram um menino de 4 anos e uma menina de 1 ano. Hoje eles têm, respectivamente, 15 e 11 anos.

Diferentemente do caso de Luanda (leia texto abaixo), os enteados de Roberta sempre tiveram uma única casa, sem vai-e-vem, modalidade que é a mais indicada por juízes, advogados de família e psicólogos. Inicialmente, as crianças permaneceram na casa da mãe. Quando o menino fez dez anos, optou em morar com o pai, mas a guarda permaneceu compartilhada. Desde então, os irmãos alternam a moradia apenas nos finais de semana. Ora o menino vai para a casa da mãe e da irmã, ora a irmã vai para a casa do pai e do irmão.

"Mas as duas casas estão sempre abertas para o pai e para a mãe. O relacionamento de nós três – meu, de meu marido e da ex – é o melhor possível", conta Roberta.

Pai e mãe, com aviso prévio, têm livre acesso às casas, sem horários rígidos de visita. Um ou outro, conforme a disponibilidade, acompanha as atividades dos filhos, desde tarefas de escola até consultas médicas, passando por competições esportivas. Na escola, professores e direção já sabem que os meninos podem apresentar dois endereços e que avisos, pedidos, reclamações e recomendações podem ser feitos para o pai ou para a mãe indistintamente.

"Além disso, não tem aquela coisa de devolver após o dia de visita. O pai não precisa levá-los no domingo à noite. Na segunda de manhã, já deixa no colégio", conta Roberta.

O Poder Judiciário não possui estatísticas, mas, apesar de a maioria das decisões judiciais ainda dar a guarda para a mãe, vem crescendo a opção dos juízes pelos pais e vêm aumentando os acordos pela guarda compartilhada.

Para Kignel, a idade da criança é uma condição importante para a guarda compartilhada, sobretudo se os pais acertam uma determinada alternância de lares. "Para uma criança pequena é impraticável", opina o advogado, acrescentando: "sempre oriento os pais a compartilhar a guarda de crianças maiores, mais próximo da adolescência".

A terapeuta e o advogado alertam: guarda compartilhada também não é uma maneira de pais espertos economizarem pensão. "Em geral, a pensão não se altera", explica Kignel. "O que acontece, às vezes, é aquele que paga a pensão passar a pagar alguns itens diretamente, como a escola ou o plano de saúde", exemplifica.

Se fosse possível fazer uma receita da guarda compartilhada, certamente teria umas pitadas de negociação, maturidade, desprendimento, compreensão, dedicação, respeito, civilidade, altruísmo, abnegação, paciência e nada de intrigas. Desnecessário, então, dizer que, nas separações litigiosas, a beligerância dos pais impede a partilha da guarda.

A Experiência de ter duas casas

A alternância dos lares não é uma regra geral em razão dos transtornos de logística que causa à criança, mas foi a experiência da jornalista Luanda Nera, hoje com 31 anos: "às vezes, era bem irritante carregar roupas, cadernos e brinquedos para lá e para cá. Além disso, no começo da escola, eu tinha umas crises sobre qual casa indicar quando pediam meu endereço. Eu nunca sabia qual dizer".

Como ela mesma define, viveu "feito um caramujinho", com a mochila nas costas, dos 5 aos 21 anos, quando os compromissos de trabalho e faculdade fizeram Luanda se fixar na casa da mãe. Mas ela louva a iniciativa dos pais e recomenda a experiência a outros casais com filhos que por ventura acabem se separando: "foi uma decisão muito madura dos meus pais, sobretudo da minha mãe, que tinha a guarda das filhas, mas preferiu abrir mão, para que eu e minha irmã, hoje com 28 anos, tivéssemos uma convivência boa e constante com o meu pai e a família dele".

Fonte: http://www2.oabsp.org.br/asp/jornal/materias.asp?edicao=99&pagina=2589&tds=7⊂=0&sub2=0&pgNovo=67

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