Ser Pai

OH, ADELAIDE!

Cronica

“Um casamento à moda antiga é aquele que sobrevive aos presentes de sua cerimônia”
(Hal Roach, diretor americano de cinema, 1892-1992)

“Oh, Adelaide!”

Para um melhor acompanhamento de meu texto, decidi dar um nome à mulher à qual me refiro sempre, a ex-mulher. Quando achar necessário, vou chamá-la por um nome. Quando achar melhor referir-me a ela por “ex”, “antiga eleita”, “ex-wife” , “sweetheart do passado”, etc, assim o farei. Pensei em diversos nomes, mas senti-me meio receoso de cometer alguma gafe ou mesmo algum ato falho. Imagine se eu a nomeio por nome de alguma antiga namorada, cantada, ou mesmo tia? Bem, dar o nome de minha mãe, isso eu não faço, aviso logo aos freudianos de plantão!

Assim, cheguei a um nome não muito comum, um pouco antiquado, com uma sonoridade de “ex”. Apresento-lhes Adelaide. Adelaides de carne e osso, não me processem, por favor! Iniciemos o texto, portanto!

Você tem, hoje, percepções bem misturadas e complexas em relação a Adelaide. Por um lado, você a enxerga como fisicamente. Esta pessoa é a mesma com quem você namorou, mesmo que ela tenha emagrecido horrores desde a última vez que a viu, na audiência de separação. Ou engordou. Ou ficou mais bonita, pois ela finalmente se livrou do encosto que você significava para ela, e assim descobriu sua sensualidade. Ou seus olhos te dizem, quando te fitam, que não te esqueceu. Mas é a mesma pessoa. Os mesmos olhos, mesmo que tristes ou rejuvenescidos. A mesma boca que você beijou. A mesma boca de onde saíram palavras amorosas e juras. E ofensas e pragas. O mesmo corpo que te deliciou no passado, o mesmo que não te desperta mais nenhum desejo. Ou todo o desejo do mundo, mais do que nunca. As mãos.... você vê que não há mais aliança no dedo. Rapidamente você lembra daquele instante que parecia mágico de colocar a um anel dourado no dedo da pessoa amada. Ou, como em alguns casos, não conseguir lembrar de nada.

Fisicamente, Adelaide é a mesma. Roupas, estética à parte, ela é a mesma. Você a reconhece na rua. Mas ela não é mais a mesma para você.

Não refiro que você a ame ainda, ou mesmo que a ame, você ainda a perceba como antes. Ela mudou. Assim como você para ela.
Vocês são ex. Ela se refere a você como “meu ex”, ou coisa pior como o surrado “falecido” – verdadeiro ato falho, e você se refere a ela como “minha ex”, ou coisa pior, ou melhor, como Adelaide.

Mas algo mudou a mais, além da nova denominação a ela. Você a percebe como uma adversária, infelizmente. Alguém que, de repente, se pinta na cara como índia e vai à guerra contra você. E você, que foi ensinado a “nunca bater numa mulher” – eu levei essa lição a sério, sempre -, fica assombrado com a força com que golpes são desferidos em você, e sua única reação é não ter reação, no máximo falar “.... vamos conversar e acertar isso com calma”.

Amigos e amigas, certamente não desejo generalizar! Podemos inverter facilmente o gênero e descrever homens que se portam desta forma com suas Adelaides. Há uma diferença....
Crianças. Como na maioria das vezes a guarda das crianças fica com Adelaide, estas se tornam – um clichê verdadeiro – moedas de troca, reféns para negociação ad eternum.

A questão da guarda será tratada aqui muitas e muitas vezes, mas sinto a necessidade de dizer que nós, homens, devemos pelo menos lutar na Justiça pela guarda, para deixar claro que queremos ser PAIS, e não apenas visitantes ou caixas eletrônicos. No momento que isto fica claro para juizes e Adelaide, as coisas se transformam. Somos levados a sério. E da mesma forma que elas foram usadas como moedas por ela, elas o deixarão de ser. E neste momento, a pensão alimentícia também será analisada de forma mais cautelosa.

Mas, ainda, como Adelaide é por nós vista?

Adversária. Mas deveria ser de parceira eterna, quando houver filhos, obviamente. Tenho certeza de que TODOS os leitores já pensaram.... – e não tenha vergonha deste pensamento -.... “por que fui ter filho com Adelaide????” Se você não tivesse filhos com ela, seu elo com ela desapareceria no momento da divisão de alguns míseros bens, pois você nunca conseguiu ser bom de negócios, fale a verdade. Que alívio não seria, hum? Mas, por outro lado, você não seria pai dos maravilhosos filhos que tem. E não adianta, os filhos existem e pronto. A parceria existe e deve (deveria!) ser levada da forma mais cordial possível.
Sempre bati nesta tecla com amigos, amigas e minha própria Adelaide: a parceria que temos é a mais preciosa possível. Ela significa a criação e amor pelos nossos filhos. Devemos estar antenados um com o outro em tudo que for relativo à vida dos filhos. Fora isso, a relação não existe. Que ela seja feliz com seu novo companheiro, quando houver, trabalho, amigos, etc., e eu, com a minha vida.

Adelaide nos percebe como adversários, também, e com razão. Ela pensa (pois nós pensamos igual) que ela talvez esteja interessada em receber benefícios na divisão de bens. Ou que queremos roubar-lhe o amor dos filhos, ou pior, desejamos substituí-la, como mãe, por outra. Ambas são crenças femininas inconscientes e disseminadas, perdoem-me dizer. Não queremos nada disso. Apenas queremos ser Pais, junto com as Mães. O binômio Pai-Mãe pode e deve ser exercido, para o bem da criança. E para o bem de todos, inclusive de Adelaide.

Partindo disso, Adelaide assume posturas e ações em total contraste com o que era, ou com o que você imagina que ela fosse. Ações arrogantes e onipotentes. Frases surreais saem de sua boca... “eu sei o que é melhor para meus filhos”, “não tenho nada para conversar com você”, “é isso e pronto”. E o pior, sente-se protegida pelas Leis ou pela lentidão da Justiça. No caso de descumprimento de visitação, então, ela sente-se segura de que não será “apanhada” nunca. Afinal, ela sabe o que é bom. E seu espanto somente cresce, sem entender quem é esta pessoa.
Seu desejo de garantir pensão maior ou melhor divisão dos bens vem acompanhado de argumentos baseados na “defesa dos interesses dos filhos”, como se você não os tivesse, igualmente. E vai tentar explicar isso para a pessoa que você melhor conhecia no passado. Imagina conhecer.

O melhor de tudo é quando ela te diz.... “você mudou, heim?!” Aí, você para pensar se Adelaide não está certa....

O assunto se estendeu tanto que nem contei com foi meu fim de semana alternado com minhas filhas. Resumindo, foi maravilhoso, como sempre. Mas sempre sentimos a falta de mais tempo.... mais intimidade... mais estórias na hora de dormir.... mais deveres de casa.... mais hamburguers com miojo..... Certamente terei o que contar da próxima visitação.

Não percam o fôlego na luta!

Um abraço a todos!

Jayme Akstein.
Autor do livro “Manual do Homem Separado”, pela Editora 7 Letras, a ser lançado.

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